Trecho da peça A Moça de Preto, clique aqui para ler na íntegra

Moça de Preto – (como se falasse para Pedro) Pedro… Meu pai morreu, Pedro… eu quero sofrer… quero morrer junto, entende? (louca) Me deixa!!!!

(Serena) Pedro não entendia isso. (feliz) Queria me ver feliz novamente. (chorando) Como ousou? Como ousou? Como ousou fazer isso comigo? (revoltada) Como ousou achar que eu não tinha o direito de sofrer pelo meu pai? Pela viuvez de minha mãe… pela minha própria viuvez.

(respira e volta mais serena e louca) Deus só existe no nascimento e na morte. Primeiro a gente agradece e depois xinga.

Pedro fez o que eu menos queria. Tentou me dar esperanças. Falava que meu pai estaria bem, pois sempre foi um homem digno.

(como se falasse para Pedro) Pedro, não vê? Não consegue ver? Toda esta dignidade o levou à morte, não vê? O levou ao sofrimento. A virtude não o salvou de ser um aleijado, um meio-homem, que implorava por mangas!

(para si mesma) Não devia ser assim. O sofrimento não devia fazer parte da regra do jogo.  Pedro me falava em algo a mais. Pensava que se eu acreditasse eu suportaria. Me fazia um discurso de que ele acreditava que a vida ia além. Que a morte não era o fim.

(Louca, para Pedro) É o fim!!!! É o fim!!! É o fim….

(Mais serena, para a plateia) Dizia que a morte era apenas uma passagem para um plano espiritual de acordo com o nosso nível de compreensão.

(como se falasse para Pedro) Pedro, eu não compreendo, não compreendo… nem quero compreender e tenho raiva de quem compreende!

(para a plateia) E que meu pai foi um homem muito bom em vida. Que estaria em um lugar belo onde depois eu o reencontraria. Dizia também que a morte não significava nada mais do que uma passagem e que a vida era uma oportunidade de crescimento.

(novamente falando com Pedro, pontuando) Foda-se!!! Foda-se!!! Foda!!!

(depois de pequena pausa, volta a si e ri) Odeio a calma de quem tem esperanças em um depois. Morreu acabou. Ou se não acabou… não sei… Só sei que… (triste) que não tinha mais meu pai comigo.

 

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